quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

O Leitor funde diversos filmes em um





O Leitor é uma produção que pode ser apreciada como três filmes distintos. Um filme desenvolve o romance entre a mulher madura, na casa dos trinta e o adolescente que é iniciado sexualmente iniciado por ela. O outro explora a responsabilidade dos protagonistas do Holocausto nos campos de concentração na Segunda Guerra. Até aí nada de novo, sobretudo para a produção holywoodiana. O terceiro filme é o mais empolgante e emocionante: o poder transformador da palavra, da leitura e dos livros. Cruzar estas três linhas com equilíbrio e sutileza foi a tarefa – nada fácil – do roteirista David Hare, que partiu do romance homônimo de Bernhard Schilink (agora relançado por aqui) e do diretor Stephen Daldry (do ótimo As Horas).

O trabalho da dupla saiu redondo, mas o brilhantismo mesmo sobrou para a parte final do filme, sobre a qual não é recomendável se alongar muito, sob pena de revelar um segredo essencial para a trama. Berlim, 1958. O jovem Michael (David Kross), de 15 anos, se apaixona pela sisuda e solitária Hanna (Kate Winslet), uma cobradora de bonde. Entre muito sexo e doses de carinho maternal, ele passa tardes lendo livros para ela, que se encanta com as histórias de Homero, Theckov e Dóris Lessing.

Um dia, Hanna simplesmente some. Anos depois, já estudante de Direito, Michael vai com o professor Rohl (Bruno Ganz, que interpretou Hitler em A Queda) acompanhar o julgamento de ex-oficiais da SS por crimes cometidos durante a Guerra.

Da platéia, Michael ouve acusações terríveis contra sua ex-amante. Ela é acusada de ser responsável pela morte de 300 detentas judias, queimadas vivas em um incêndio. Questionada sobre sua responsabilidade no ato, Hanna se limita a afirmar. "Nós simplesmente não podíamos deixá-las sair, pois elas iam escapar".

O longo julgamento leva Michael a um grande dilema moral. Ele é a única pessoa que pode inocentar Hanna. O filme então questiona o conceito de omissão, partindo para reflexões morais. A covardia de Michael não seria a mesma da mulher que cumpria ordens nos campos de concentração?

Em sua fase adulta Michael é interpretado por um silencioso e distante Ralph Fiennes (que já foi o psicopata nazista em A Lista de Schindler), um homem que fracassou em seu casamento, que se mantém distante da família e da única filha e que vive relacionamentos instáveis com estranhas. Sinal de que a relação com Hanna deixou profundas cicatrizes em sua vida.

Iniciação sexual com mulher mais madura não chega a ser um tema original, bem como as conseqüências do Holocausto. Estes dois filmes em si não chegam a empolgar. O Leitor deslancha quando aborda o maravilhoso universo dos livros, dos personagens imaginários e suas aventuras em terras distantes, expressas em palavras que salvam toda uma existência de seus pecados do passado. Contar mais seria comprometedor. Melhor assistir ao filme nos cinemas.

Para além das referências simbólicas do seu elenco, com atores que já encarnaram tipos nazistas, vale destacar a presença de Kate Winslet. Há casos em que o tempo só faz bem às pessoas. Descolada da namoradinha de Titanic, ela encarna uma mulher que carrega um segredo terrível em sua vida.Em todas as cenas em que aparece, sente-se que há um peso sobre suas costas. Seca, direta, esquentada, distante no início. Depois, serena, suave e mais leve, como se conformada com o destino. Já levou o Globo de Ouro de Melhor Atriz e deve levar o Oscar.

(publicado origanlamente no portal Bem Paraná e Jornal do Estado de 11.02.09)

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