domingo, 22 de novembro de 2009

Mysterios é ode a Curitiba, ao cinema e aos pesadelos

Acabei me alongando demais no post anterior, mas a intenção era tratar do filme em si. Mysterios narra três contos, tendo como fio condutor justamente o mistério. No primeiro deles, uma moça desaparece ao dar uma volta no trem-fantasma do Parque Alvorada. Dos três segmentos, foi o que mais gostei. Tem um clima de nostalgia inocente do final dos anos 60, mais precisamente na mesma semana em que o homem pisa na lua. O tratamento visual e sonoro é impecável - uma marca que por sinal se mantém durante todo o filme. O Passeio Público com seus vendedores de mação do amor, o lambe-lambe interpretado pelo Hugo Mengarelli, a trilha pop-brega com "Se Deus Me Ouvisse", tudo remete a um tempo mais tranquilo, com menos correria, mais esponteneidade e simplicidade. Mas a intenção do filme nao é apenas recriar uma Curitiba que se perdeu. É partir desta cidade que o tempo esqueceu - quem lembra do divetido trem-fantasma do Alvorada? - que o filme mergulha no desaparecimento da garota. Em tempos de ditadura, a crônica policial explorou à exaustão este sumiço, o que permite ao filme um tratamento gráfico e sonoro bem modern, inserindo trechos de manchetes de jornais, imagens de livros antigos e narrações radiofônicas.
O segundo segmento trata da descoberta de fragmentos de um filme dos anos 20 em um galinheiro. Pouco se salva da fita erótica, pouco se sabe de seu realizador. É uma baita homenagem aos pioneiros do cinema paranaense, Anibal Requião e Joao Batista Groff, citados no trecho. A fotografia em PB consegue criar com riqueza de detalhes os trechos da fita danifica e direção de arte segura e inventiva traduz o clima erótico em torno de um grupo de belas jovens seminuas filmadas por um anônimo na provinciana Curitiba dos anso 20.
O terceiro segmento é o mais surreal dos três. Em um espetáculo de mágica, a assistente do ilusionista se fere durante a apresentação. Dizer isso nao siginifca nada. É o mesmo que citar sinopse em filme de David Lynch, cujo visual de pesadelo parece ter sido a fonte na qual beberam os realizadores do filme.
Os três contos são costurados pela presença de um narrador, interpretado por Carlos Vereza, que ora se limita a tentar interpretar o que vê, ora participa mais ativamente das situações.
É uma produção de um capricho especial na imagem e no som, que mostra a maturidade e a originalidade do cinema feito atualmente em Curitiba, que parece estar trilhando um caminho muito rico e pessoal, sem embarcar na fórmula do drama social de viés urbano - dominante nas produções paulistas e cariocas.
O trabalho dos diretores Beto Carminatti e Pedro Merege é sólido, ousado, detalhista e consegue explorar com habilidade a idéia de que o desconhecido, o estranho, o que nao se vê está mais presente na realidade do que a gente imagina. Mysterios é um exercício de sutilezas visuais e sonoras, uma homenagem a uma Curitiba perdida, uma ode ao cinema dos pioneiros e anônimos e um belo pesadelo em cores fortes.
Avisem os amigos , corram ver. Está no Crystal Arteplex.

Nenhum comentário: