sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Foi apenas um sonho expõe infelicidade conjugal no pós-Guerra





>Enquanto assistem à pior crise de sua história e esperam milagres por parte do novo presidente, os americanos sentem saudades dos anos 50. O país acabava de sair vitorioso da Guerra contra o nazismo na Europa. O conflito turbinou a economia, gerou empregos e fixou as bases do grande mercado de consumo de bens duráveis. É a era dos maridos empregados em grandes corporações e suas esposas, donas de casas sorridentes, ambos instalados em casas confortáveis nos subúrbios dos grandes centros.


Esta América dos sonhos, que em sua aparência exala felicidade material mas em seu íntimo cobra o preço da conformidade e do vazio de rotinas previsíveis de seus membros, é a base do romance Revolucionary Road, de Richard Yates, adaptado para as telas com o título em português de Foi Apenas em Sonho.


O nome original refere-se à rua onde vive o casal que protagoniza o filme, condicionando esta existência a um conjunto de valores típico dos subúrbios: crença no conforto material e acomodação com os papéis masculino e feminino dados pela sociedade.


Mais de década após estrelarem Titanic, o filme de maior bilheteria em toda a história do cinema, Leonardo Di Caprio e Kate Winslet voltam a atuar juntos em uma produção. Mas desta vez, nada de amores impossíveis ou romantismos juvenis em alto mar.


No longa, eles dão vida ao jovem, admirado e belo casal Wheeler. Frank é um trintão que não sabe muito bem o que quer. Na falta de coisa melhor e como precisa sustentar a mulher e duas crianças, passa os dias odiando seu emprego na Knox, uma companhia de equipamentos. Para espantar o tédio, fala mal dos chefes e seduz secretárias.


Frank é casado com April, que em sua juventude queria ser atriz. Apesar da rotina de mãe de dois filhos e dona-de-casa, ela não desistiu totalmente de seus sonhos e segue atuando em produções sofrivelmente amadoras.


Se Frank é o sonhador conformado com um horizonte medíocre em um trabalho maçante, April traz da experiência fracassada no teatro a centelha da esperança em uma vida mais intensa, longe de vizinhos entediantes, empregos monótonos. Sugere ao marido que se mudem para Paris, onde tudo é mais intenso e divertido e mais: ela se propõe a sustentá-lo enquanto ele encontra sua verdadeira vocação.


O que se apresenta como solução para que Frank e April encontrem o verdadeiro sentido de suas vidas na verdade passará a servir de pretexto para que o filme questione a possibilidade de felicidade a dois e quanto de sacrifício pessoal um casamento exige, o quanto este sacrifício vale a pena e os casos em que ele pode ser completamente inútil.


O diretor Sam Mendes volta ao terreno de um de seus trabalhos mais expressivos, Beleza Americana, ao observar com lente de aumento o que está por trás de uma vida de prosperidade na classe média americana. Até que ponto as frustrações individuais podem ser sufocadas em nome de uma rotina previsível, monótona, onde a única novidade é observar o crescimento dos filhos.


O conformismo coletivo é apresentado como uma grande doença da qual toda a sociedade padece sem perceber. Neste sentido, o personagem John Givings, o louco que recebeu choques elétricos no hospício, é a única pessoa capaz de revelar verdades terrivelmente dolorosas sobre os planos dos Wheeler de se mudarem a Paris e seu adiamento em função da carreira de Frank.


O título original guarda uma ironia que a tradução (infeliz) perdeu. Revolocionary Road é uma vizinhança arborizada, calma, agradável, o lugar perfeito para se criar os filhos, mas de revolucionária mesmo não tem nada. Ao contrário, cria todo um cenário para que os que nela vivem recusem seus sonhos individuais e aceitam com resignação projetos alheios, previsíveis e limitantes.

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